sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Tanto para ler - Entre Katrina e Columbine

Eugênia Cabral
eugeniacabral@dedodemocaseditora.com.br
@eugeniamcabral

O prêmio de literatura nacional dos Estados Unidos, National Book Awards 2011, foi conquistado pela autora Jesmyn Ward com a ficção “Salvage The Bones”. A história retrata uma comunidade norte-americana atingida pela passagem do furacão Katrina, no Mississipi, e recebeu excelentes críticas desde seu lançamento. No discurso de agradecimento, Jesmyn disse que foi inspirada a seguir seu sonho de se tornar escritora depois da morte de seu irmão, que foi atingido por um motorista bêbado no ano em que ela se formou na faculdade.


Para a escritora, “livros são um testemunho de força ante um mundo punitivo”. E assim, os acontecimentos do furacão e o que os sobreviventes enfrentaram em seguida (roubos, assassinatos e estupros dentro dos locais de refugiados) culminaram no que foi considerado o romance mais importante do ano naquele país.


Esse é um testemunho que muitas vezes aparece no discurso de pessoas relacionadas com a arte. Ela é nosso estandarte contra a perenidade da vida. Achei interessante, no entanto, pensar no sentimento de perda e vazio que gera a arte. Se Sócrates não tivesse sido condenado à morte, nós teríamos a “Alegoria da Caverna”? Talvez sim, mas talvez o texto não estivesse tão apaixonantemente escrito se Platão não tivesse vivido a dor de perder seu mestre.


Os assassinatos brutais de crianças em uma escola norte-americana em Columbine provocou a autora Lionel Shriver a mergulhar na sociedade que cria assassinos mirins. Assim como Michael Moore fez no documentário “Tiros em Columbine”, ela traz uma abordagem diferente do acontecimento que não tem nada de “videogames provocam violência” ou “culpe a televisão”.


A mãe de Kevin Khatchadourian, o assassino, escreve cartas para o pai ausente do menino e nelas discute a criação do filho, o relacionamento entre eles e suas próprias escolhas de vida dentro de uma sociedade dominada pelo senso de absurdo. O livro é controverso e discute se a própria decisão da maternidade tem muito a ver com nossas atuais crianças. A história, que não é real, tem elementos de vários desses crimes que, infelizmente, tornaram-se recorrentes nos Estados Unidos.


Não uma face bonita da nossa humanidade para ser eternizada, mas uma provocação em resposta ao que vivemos. Seria mais agradável viver num mundo só com o lado da Comédia. Mas se vamos ter que enfrentar a Tragédia, que ela dê frutos de reflexão, pelo menos. Enquanto isso, já estou aguardando a tradução do livro da Jesmyn Ward aqui no Brasil.

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